Uma das piores e mais aleivosas calúnias já dirigidas contra o cristianismo é a de que ele condena o corpo. Nada mais distante da pura doutrina cristã, tal como ensinada e testemunhada pela santa Igreja católica, do que este absurdo. Dentro da perspectiva cristã, condenar o corpo é anátema, pois o corpo é criação de Deus Nosso Senhor, o Bem em plenitude, de quem nenhum mal pode provir. Efetivamente, diz a Escritura: "E Deus viu todas as coisas que tinha feito, e eram muito boas" (Genesis 1,31).
O que o cristianismo e a Igreja sempre condenaram, e nunca poderão deixar de condenar, são os abusos do próprio corpo, a intemperança, a falta de autodomínio, a desordem sexual. Como muita gente vê o corpo unicamente como um instrumento para fazer o que não deve, então logo imagina que a Igreja condena o corpo. Mas o problema, então, não está na Igreja, mas na baixa concepção de vida que essas pessoas têm.
Para o cristianismo, o mal ético não está nas coisas. As coisas foram criadas por Deus e tudo o que Deus criou é bom (cf. Gen 1,31). O mal ético está nos atos humanos. Jesus deixou isso claro quando disse: "Ouvi e entendei. Não é aquilo que entra pela boca, que mancha o homem, mas aquilo que sai da boca, isto é que torna imundo o homem.
Não compreendeis que tudo o que entra pela boca passa ao ventre, e se lança depois num lugar escuso? Mas, as coisas que saem da boca, vêm do coração, e estas mancham o homem; porque do coração saem os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios, as fornicações, os furtos, os falsos testemunhos, as palavras injuriosas. Estas são as que mancham o homem" (Mateus 15,10-11.17-20). Portanto, o mal não está no corpo, mas no abuso do corpo.
Para o cristianismo, o corpo não é algo condenado, mas "o templo do Espírito Santo" (1Cor 6,19). E o mesmo Espírito Santo que santifica a alma, há de ressuscitar o nosso corpo no último dia.
Efetivamente, cremos firmemente que, da mesma forma que Jesus Cristo verdadeiramente ressuscitou dos mortos, e vive para sempre glorioso, assim também Deus nos ressuscitará no último dia, retomando cada alma o corpo que teve nesta vida. Pode parecer difícil de acreditar, mas não para quem sabe que "a Deus nada é impossível" (Lucas 1,37).
Essa promessa de Deus, de que nos há de ressuscitar, é muito consoladora porque, se pudéssemos sentir a falta de algo no Céu, sentiríamos a falta do nosso corpo. Isso porque a ligação de nossa alma com o corpo não é extrínseca. Corpo e alma formam um todo substancial. Como ensinou o filósofo grego Aristóteles, "a alma é a forma substancial do corpo".
Aí vemos quão errados estão os espiritas, que imaginam que a alma troca de corpos, como o corpo troca de cuecas. Formando alma e corpo um todo substancial, fica facil entendermos que cada corpo existe para determinada alma, e cada alma para determinado corpo. O que é o corpo senão um instrumento da alma (o "irmão jumento" de que falava São Francisco de Assis)? Ora, sendo o corpo o instrumento da alma, deve ser esse um instrumento a ela adequado.
Para que não duvidássemos que no fim do mundo hão de ressuscitar todos os mortos, Deus Nosso Senhor ressussitou Jesus dos mortos como primicias, e nos revelou a promessa da ressurreição nos ultimos dias:
"Porque eu sei que meu Redentor está vivo,
Que no último dia ressurgirei da terra,
Serei novamente revestido da minha pele,
E na minha própria carne verei meu Deus" (Jó 19,25-26).
"Os teus mortos viverão,
os meus a quem tiraram a vida ressuscitarão;
despertai e cantai louvores,
vós os que habitais no pó,
porque o teu orvalho será um orvalho de luz,
e tu reduzirás à última ruína a terra dos gigantes" (Isaías 26,19).
"A multidão dos que dormem no pó da terra, acordarão uns para a vida eterna e outros para o opróbrio, que terão sempre diante dos olhos" (Daniel 12,2).
Contudo, mesmo que anunciada no Antido Testamento, a Ressurreição dos mortos está essencial e intrinsecamente ligada ao mistério de Cristo. Realmente, a Ressurreição dos mortos é fruto da insigne vitória de Cristo sobre a morte.
Todos hão de ressuscitar, sem distinção entre bons e maus. À Ressurreição se seguirá o Juízo Final. Com efeito, embora bons e maus hão de ressuscitar, uns e outros terão destinos diferentes.
A imortalidade, depois da ressurreição geral, também será comum aos bons e aos maus. Todavia, se a imortalidade para os bons será um prêmio, para os maus será um castigo, pois significará a perpetuidade dos seus sofrimentos em sua própria carne. De fato, diz a Escritura:
"buscarão a morte e não a encontrarão; desejarão morrer e a morte fugirá deles" (Apocalipse 9,6).
O corpo não ressurgirá simplesmente, mas ser-lhe-á restituído tudo o que pertencer à integridade e perfeição de sua natureza. Os cegos de nascença, os que perderam a vista por algum acidente ou enfermidade, os aleijados, coxos e manetas ressurgirão com o corpo íntegro e perfeito.
Não precisarão mais alimentar-se, pois serão imortais: "não terão mais fome nem sede, nem cairá sobre eles o sol, nem calor algum" (Apoc 7,16). Na Ressurreição também não haverá mais sexo, pois não haverá mais a necessidade da reprodução humana. De fato, disse o Senhor Jesus: "Na Ressurreição, nem os homens terão mulheres, nem as mulheres maridos, mas serão como os anjos de Deus no Céu" (Mt 22,30).
Os bons ressuscitarão como foram criados originariamente pelo Verbo de Deus: ágeis, impassíveis e incorruptíveis.Todos os seus anseios estarão completamente satisfeitos e isso compensará infinitamente todos os sofrimentos e aflições por que passaram nesta vida. Estarão libertos de todos os desejos, necessidades e limitações do corpo. A lembrança desta promessa de Cristo nos serve de poderoso consolo e fonte de coragem em nossas tribulações, tristezas e calamidades.
Outro dote que adornará depois da Ressurreição os corpos dos que agradaram a Deus nesta vida, será o da claridade. Os corpos ressuscitados dos bons serão resplandecentes, como prometeu Nosso Senhor no Evangelho: "Resplandecerão os justos como o sol no Reino de seu Pai" (Mateus 13,43). Para que ninguém duvidasse desta promessa, Nosso Senhor deu o exemplo de sua propria Transfiguração: "seu rosto ficou refulgente como o sol e as suas vestiduras tornaram-se luminosas de brancas que estavam" (Mateus 17,2). Como disse o Apóstolo: "Nosso Senhor Jesus Cristo transformará o nosso corpo de miséria, fazendo-o semelhante ao seu corpo glorioso" (Filipenses 3,21).
Finalmente, devemos dizer que a fé na Ressurreição dos mortos, e nas promessas que ela envolve, tem preciosos frutos: elimina o medo da morte, modera a tristeza que sentimos pela morte de nossos entes queridos, é um poderosíssimo consolo nos sofrimentos da vida, torna-nos atentos e cuidadosos a viver bem e nos afasta do mal e do pecado. Se a vida dos homens é apenas esta na qual vivemos, não seria necessário tanto esforço para vivermos de acordo com o bem e a justiça. Diz o Apóstolo: "Que me aproveita isso, se os mortos não ressuscitam? Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos" (1Cor 15,32). Se não há a Ressurreição, é vã a nossa Fé (cf. 1Cor 15,17).